A Limitação Humana e a Democracia: A Crítica de Dunning à Inteligência Coletiva

O processo democrático presume que os cidadãos, ou pelo menos a maioria deles, sejam capazes de reconhecer o melhor candidato político ou a ideia política mais adequada quando a veem. No entanto, um número crescente de estudos desafia essa premissa, mostrando que, muitas vezes, as eleições democráticas resultam na ascensão de lideranças políticas medíocres.
A pesquisa conduzida por David Dunning, psicólogo da Universidade de Cornell, revela um aspecto fundamental da psicologia humana que refuta essa ideia. Segundo Dunning, as pessoas incompetentes são naturalmente incapazes de avaliar com precisão a competência dos outros ou a qualidade das ideias que apresentam. Por exemplo, se alguém não possui conhecimento suficiente sobre uma área, como a reforma tributária, é impossível para essa pessoa identificar os candidatos que são verdadeiramente especialistas nesse campo. Sem as ferramentas mentais necessárias, qualquer julgamento sobre os candidatos se torna falho, independentemente da quantidade de informações ou fatos apresentados.

Além disso, as ideias mais sofisticadas tendem a ser difíceis de adotar pelas pessoas, pois a maioria delas não possui a sofisticação necessária para perceber o valor dessas ideias. Dunning observa que muitas vezes "ideias muito inteligentes" passam despercebidas, pois são difíceis de ser reconhecidas pela maioria.

Em colaboração com Justin Kruger, ex-aluno de Cornell e agora na Universidade de Nova York, Dunning demonstrou em várias pesquisas que as pessoas tendem a se autoavaliar como "acima da média" em diversas áreas, como humor, gramática ou até desempenho em jogos de xadrez, mesmo quando seus resultados são significativamente abaixo da média. Esse fenômeno é resultado da incapacidade das pessoas incompetentes de reconhecer suas próprias falhas, o que as torna igualmente incapazes de avaliar as falhas dos outros.

Assim, à medida que a incompetência cresce, a capacidade de julgar a incompetência dos outros diminui. Como afirmou Dunning, "Na medida em que você é incompetente, você é um mau juiz de incompetência das outras pessoas". Esse dilema se agrava no contexto democrático, pois pessoas desinformadas ou sem especialização podem ser os piores juízes ao escolher candidatos ou ao avaliar ideias políticas. Isso reflete uma cegueira coletiva, fruto da falta de conhecimento especializado de todos.

O sociólogo alemão Mato Nagel aplicou as teorias de Dunning e Kruger em uma simulação computacional de uma eleição democrática. Em seu modelo matemático, ele assumiu que as habilidades de liderança dos eleitores seguiam uma distribuição normal — alguns eram excelentes líderes, outros muito maus, mas a maioria era medíocre. Cada eleitor, incapaz de reconhecer habilidades superiores às suas próprias, tendia a escolher candidatos cujas habilidades de liderança estavam apenas um pouco acima da média. O resultado, em suas simulações, mostrou que as democracias raramente elegem os melhores líderes. A principal vantagem da democracia, então, seria evitar que candidatos com habilidades inferiores à média chegassem ao poder.

Nagel concluiu que, em uma democracia, o processo eleitoral não garante a ascensão dos melhores líderes, mas, ao menos, impede que pessoas com habilidades significativamente abaixo da média conquistem posições de liderança.

Esta análise, retirada de "Pequenos Mistérios da Vida" (LiveScience), destaca as limitações do processo democrático e como as falhas humanas, tanto no julgamento de si mesmos quanto dos outros, contribuem para as falhas estruturais das democracias modernas.

Francisco Gonçalves 

Francis.goncalves@gmail.com 

Comentários

Mensagens populares deste blogue

O novo governo e a esperança sempre renovada dos portugueses!

A Guerra na Ucrânia e o que está em causa na Europa e no Mundo.

"De Rerum Natura" ( Da Natureza das Coisas )